Hoje em dia, desconheço categoria profissional tão resiliente e, ao mesmo tempo, tão submissa quanto a dos educadores da Secretaria de Educação de São Paulo. São milhões de professores ou gestores, tanto em nível escolar como nas Diretorias de Ensino e Coordenadorias, não só admiráveis por sua competência e por seus esforços contínuos de aperfeiçoamento profissional, como também por sua capacidade de enfrentar situações adversas, habilitados, a duras penas, a lidar com a pressão das constantes mudanças sociais e dos governos e, ao mesmo tempo, diante do fracasso escolar, não esmorecerem nem se deixarem abalar, e que obedecem, quase que de modo subserviente, aos mandos e desmandos de gestores autocráticos, buscando sempre arranjar uma forma de se adaptar às mudanças e seguir na luta por objetivos comuns.
Conquanto o entra e sai de governos, as mudanças das equipes de gabinete e dos secretários de educação, sempre com novas políticas públicas submetidas goela abaixo a todos os profissionais da pasta, os educadores seguem exercendo seu labor de maneira heroica, éticos e abnegados, mas sempre sujeitos às intempéries governamentais visivelmente contaminadas pelas “políticas do faz de conta” ou ainda pela antiga e perversa “politicagem” com fins eleitoreiros ou com o mero propósito de convencer a alienada opinião pública. Apesar de anos de políticas públicas em educação que não atingem a raiz do problema e de seus algozes, os educadores persistem em seus esforços, como povo marcado, mas povo infeliz.
Foco em novas metodologias de ensino, utilização de diversas plataformas digitais, aplicação de avaliações externas bimestrais para averiguar desempenho, gestão de currículo, apoio presencial dos gestores em sala de aula etc., são ações de aperfeiçoamento natural do sistema, inclusive de qualquer setor que prima pela busca de qualidade e atualização constantes. Mas fora do foco, todos os esforços tornam-se em vão (E os bilhões em verbas destinados às mudanças e inovações, desperdiçados), visto que não se observam mudanças significativas na qualidade da aprendizagem dos estudantes nem nas condições de trabalho dos educadores, que se veem “gregos” para aplicar nas escolas e na rede tudo que lhes é imposto. Infelizmente, os pesquisadores e teóricos acadêmicos da pedagogia moderna ainda persistem em defender a tese de que a culpa da baixa qualidade da educação reside nas aulas ministradas pelos professores ou na gestão escolar ou de sistema.
Tencionando sanar o triste atraso social do Brasil, sempre caracterizado pela desigualdade econômica e cultural, acreditava-se que era necessária uma profunda revolução a partir da educação. Por causa do alto índice de evasão e abandono escolar, implementou-se na educação pública paulista, já nos idos de 1998, a Progressão Continuada dos estudos, retirando-se dos bancos escolares a retenção. Hoje, depois de todo esse tempo, constata-se que gerações de estudantes passaram a frequentar a escola, conseguiram galgar as etapas e séries escolares sem precisar repetir de ano, porém a qualidade da formação educacional que atingiram ficou muito aquém do que se esperava, o que gerou milhões de estudantes atrasados, sem o mínimo de competência leitora e escritora, com baixo desenvolvimento de seu raciocínio lógico-matemático. Além disso, ano após ano percebe-se massas de estudantes que não se esforçam mais para o estudo, não se dedicam o suficiente para ampliar competências e habilidades básicas para uma boa formação educacional, porque são promovidos, muitos dos quais com ausências às aulas acima da média permitida por lei, sem adquirir hábitos de estudo e espírito de busca para a ampliar seu conhecimento.
Nesse ponto, devemos questionar: Privar o estudante de uma formação sólida de qualidade também não é excluí-lo de seus direitos e aprisioná-lo eternamente em sua condição social e cultural, tornando-o massa de manobra cada vez mais ignorante e alienada? Passados mais de vinte anos, precisamos de coragem para acabar de vez com a Progressão Continuada, que na realidade tornou-se promoção automática. Salvo exceções, os alunos continuam se ausentando dos bancos escolares, não valorizam a escola nem a figura do professor, tampouco se esforçam ou se dedicam para aprender cada vez mais, num processo de desvalorização contínua do estudo e da escola como principal instituição de acesso aos bens culturais historicamente desenvolvidos pela humanidade.
Para o retorno da retenção anual, precisaremos aprimorar os mecanismos de recuperação das defasagens de aprendizagem dos estudantes. Para isso, os gestores escolares precisarão instituir os meses de janeiro e julho, como os meses destinados aos alunos que ao longo do semestre apresentaram baixo desempenho e faltas às aulas, sendo esse um dos requisitos para se passar de ano. Também as avaliações externas, tanto as estaduais como as federais, precisam ser aplicadas nos meses de férias escolares, porque os alunos estão perdendo mais de dez dias do calendário escolar apenas com a aplicação dessas provas, muitas das quais sem a devolutiva do desempenho individual dos alunos. Também deve-se exigir bom desempenho nessas provas como um dos critérios para aprovação anual. Além disso, para passar de ano exige-se nota mínima 5 (cinco), que é baixa, e se o aluno ficar reprovado em até 3 (três) disciplinas ou componentes curriculares, ele é aprovado de ano/série mesmo assim, o que inviabiliza a continuidade do estudo nessas disciplinas no ano posterior, por falta de domínio do conhecimento básico necessário para continuar avançando nos estudos.

Marcos Humberto Paulon de Lima (CGPG da EE.Prof. Akió Satoru de Urânia-SP)

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